terça-feira, 13 de setembro de 2016

No Interior se Gera a Vida


Tal como uma semente, que tem que cair em solo fértil para vingar, também uma ideia, um desejo, um amor, precisa da mesma fertilidade, e das condições de protecção e evolução para crescerem forte e saudavelmente. Mas é no exterior que tantas vezes nos focamos. Procuramos coisas, amor, realização... Procuramos o que pensamos querer (e precisar) para nos sentirmos a viver. Em vão, esperamos que cresça, apesar de não lhe darmos solo (ou colo). Na verdade, esse só existe no nosso interior. Sem sabermos, toda a fertilidade de que necessitamos está dentro de nós. É no ventre que se gera e cresce a vida, ciclo após ciclo.  É aí que começam os milagres. Mas a vida não é exclusiva de um novo Ser que venha ao mundo. Vida é tudo o que conseguimos construir, gerar, fertilizar ao longo de uma vida já existente, e tão preciosa quando qualquer outra. A nossa.

Focados no exterior, procuramos elogios, procuramos que nos amem, procuramos que nos valorizem e dêem reconhecimento. E por vezes, até o conseguimos ter. Mas aí, tal como escravos da “exterioridade”, continuamos a mendigar, a lutar por mais, na expectativa de que possamos sentir que ganhamos um pouco também dentro de nós. De alguma forma, é como fixar-nos numa semente, e contemplá-la longamente, sem lhe pôr terra, sem a regar, sem a cuidar e amar verdadeiramente, ainda que com a expectativa de a ver crescer e a poder “sentir”. Por vezes até, há quem agarre essa semente, e que tente cuidar dela no nosso lugar. Mas aí, nunca será a nossa semente e no íntimo sentimos isso. O que queremos para nós, só pode vir do mais fundo das nossas entranhas. É aí que se esconde a “Alma”. É aí que guardamos a Vida. A nossa vida. É por isso que digo que só vive verdadeiramente quem se vive a si mesmo. Quem olha, vê, contempla e cuida do seu interior. Quem chora as suas mágoas, sorri as suas alegrias, ama e odeia cada minuto da sua própria vida, numa honestidade (tão difícil quanto libertadora) do que verdadeiramente é, e tem. É no interior que se gera uma vida, é no interior que se guarda a vida de quem partiu, é no interior que vive quem amamos, é no nosso interior que vivemos verdadeiramente. Só assim, germinará a semente e abrirão um dia as suas flores, crescerão os seus frutos, que esses sim, contemplarão o sol e farão as delícias de quem escolhemos ter, também, no nosso exterior.  

Originalmente publicado em "Noticias de Cá e de Lá" edição 42 de 10 de Agosto.

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