quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

Boas Festas!


O Natal é sempre doce quando aprendemos sentir amor por nós, e escolhemos Amar quem nos rodeia. Que cada um possa acender a chama em si, tornando o seu Natal mais caloroso! As melhores das festas para todos! heart emoticon

quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

O Natal em Nós

Comemorar uma data. ainda que possa servir para pensar, traçar ou celebrar um futuro, remete na grande maioria das vezes para a lembrança de um passado. No aniversário, celebramos o dia em que nascemos. Ainda que nos leve a pensar em todos os dias mais que queremos ter na nossa vida, a verdade é que estamos a festejar os que já passaram. As datas históricas permitem-nos fazer o ponto da situação, pensar no como era antes, no que passou a ser depois, e permitem-nos relembrar acontecimentos que nos trouxeram até ao ponto em que nos encontramos hoje. Com o Natal não é diferente. Mas o Natal, tem o poder mágico de nos transportar ao nosso interior, ao Natal que há em nós. Porque na verdade, não existem dois Natais iguais para ninguém. Esta data, quer queiramos quer não, tira-nos do agora e tem o dom de nos transportar para as nossas vivências de amor, ou falta dele, de alegria, ou de tristeza, leva-nos ao encanto e à ilusão, ou ao medo e à frustração. As luzes, as músicas, as pessoas ou simplesmente um respirar de Natal, e activam-se em nós sentimentos. E de repente, choramos quem queríamos ter ao nosso lado, relembramos o melhor e o pior dos Natais da nossa vida, e por instantes, voltamos a sentir a nossa infância. Inundamo-nos de sensações, que podem ter tanto de rico quanto de angustiante. 

Há quem se irrite com as músicas, quem se enterneça, quem se entristeça e quem se anime. Há quem adore as decorações e o movimento, outros acham esta época pirosa e consumista. Algumas pessoas não param de pensar na trabalheira e na quantidade de coisas para fazer. Outras brilham com a ideia das festas, dos doces e dos presentes. A verdade é que há Natal para toda a gente. Cada um espelhando as nossas vidas (prática, física e emocional). Pode ser melhor ou pior, mais abundante ou em escassez. Mais voltado para o consumo ou solidariedade, mais para a religião ou família. Aceitando-o nas nossas vidas ou rejeitando-o completamente, não podemos sair de casa, ligar a televisão ou pura e simplesmente accionar a memória, sem que ele esteja lá, para como bom espelho que é, nos mostrar um pouco do que temos cá dentro... Para nos mostrar um pouco, o que ainda queremos ter e quem sabe, um dia ainda queremos vir a Ser. 

Se para muitas pessoas o Natal é o confronto entre o desejo e medo de ser feliz, então que esse desejo possa ser mais forte que o medo, para que assim, a cada Natal, possamos estar cada vez mais próximos de nós mesmos e de todas as pessoas que queiramos verdadeiramente ter ao nosso lado.

Boas Festas.

Originalmente publicado no Jornal de "Notícias de Cá e de Lá". Edição de Dezembro

quinta-feira, 26 de novembro de 2015

"De terroristas e de loucos..."

Partilho um texto que escrevi em Janeiro de 2015 e que, infelizmente, volta à actualidade.

Quarta-feira, 7 de Janeiro, a tragédia de Paris confronta uma Europa, já de si tão ocupada a (di)gerir as suas trapalhadas económicas, com mais um desafio! Ainda que não represente uma realidade completamente nova, o violento ataque ao jornal satírico "Charlie Hebdo”, por ter acontecido no “nosso quintal”, põe a descoberto uma vulnerabilidade que nos obriga a todos a reflectir e a posicionar-nos perante realidades que tantas vezes preferimos ignorar. Como forma de nos sentirmos mais seguros, é muito fácil classificar os responsáveis por tais actos de loucos e/ou psicopatas. Queremos acreditar que loucos à solta por aí, apesar de tudo, não devem ser tantos assim!
No entanto, entenda-se que sociopata (o termo mais correcto) é uma coisa, e terrorista, é outra bem diferente. É verdade que existirão sociopatas que são terroristas, mas é também verdade que muitos terroristas não apresentam necessariamente traços de doença mental e, tirando o discurso que reflecte a sua ideologia, não se conseguem perceber “anormalidades”. Quer isto dizer que não podemos definir um perfil tipo, embora não se possa negar a existência de dimensões psicológicas subjacentes. Tanto mais se pode afirmar isto, pelos contornos de frieza e crueldade de que se reveste o crime. 
Acresce que estas pessoas nasceram e cresceram em França. País de acolhimento de seus pais, e ao qual não hesitam em dirigir o seu ódio. Há pois que saber que terroristas nascidos e educados em contextos de morte e de raiva e cuja estrutura mental é dominada por valores radicalmente diferentes dos nossos, é um fenómeno bem diferente de terroristas nascidos e educados num país ocidental, no qual a informação circula e “transborda”. 
Este é um risco que assiste a todos os jovens franceses? É natural pensar que necessariamente estas pessoas, estavam de alguma forma mais vulneráveis, zangados. Podemos imaginar que eram dotados de pouco sentido crítico e de capacidade de dialogo. Parece-me certo que estes homens terão histórias pessoais muito particulares. Estes ingredientes, aliados aos seus valores e crenças, serão a receita ideal para a tragédia.
Se olharmos nesta perspectiva, fica então a descoberto, o insucesso de toda uma estrutura que se quer sólida. Família, escola pública, sociedade e política falharam! Apressamo-nos às armas, alianças e acções conjuntas. Mas se queremos dar resposta a este atentado, então não será também aí que deveremos intervir?
Não quero, de todo, com isto desresponsabilizar cada um dos elementos envolvidos. Estamos a falar de homens treinados militarmente e de uma acção planeada e premeditada. Convido-vos sim, a uma reflexão mais alargada, na qual nos permitimos olhar para o papel de todos e de cada um.
É fácil indignarmo-nos e gritarmos por valores mais altos e nobres como liberdade, tolerância e respeito pela vida humana. Mas eu não posso deixar de pensar na forma como estes valores existem na sociedade e em cada um de nós. Terão sido interiorizados mecanicamente? Fruto de uma pressão e evolução social, ou serão mesmo nossos intrinsecamente vividos e sentidos? Farão parte da nossa essência?
Confesso que me assusto de cada vez que leio comentários a artigos e/ou opiniões veiculadas na internet. Assusta-me sempre que se ferem ou matam pessoas porque eram adeptos de outros clubes. Assusta-me sempre que se humilha, ameaça ou diminui alguém apenas porque é diferente de nós. Assusta-me que se olhe com uma “indignação indiferente” para a miséria, injustiça e sofrimento alheio. Será caso para relembrar que “de terroristas e de loucos, todos temos um pouco?”.

Originalmente publicado na edição 28 do
Jornal  "Notícias de Cá e de Lá" (31 de Janeiro de 2015)

"Eu quero. Talvez. Não sei..."

É muito fácil dizer "eu quero" ou "eu penso". Difícil, é querer mesmo. Difícil, é pensar livremente sem a "poluição" dos todos os nossos medos, fantasmas, culpas e limitações (auto-impostas). Parece-me infelizmente que, nos dias que correm, existe muita vontade e muito pouco querer. Ouvem-se muitos "quero mudança", "quero estar mais feliz", "quero ter mais", que parecem situar-se ao nível de um "querer" infantilizado, em que a criança espera que alguém, que não ela, faça os seus desejos se realizarem. Isto porque quando perguntamos a algumas pessoas (dadas a "fortes" desejos) o que estão a fazer efetivamente para alcançarem o que pretendem, percebemos que, na realidade, é um absoluto NADA.

Contudo, não deixa de ser interessante analisar esse "nada". Porquê o esforço, quando, na realidade, podemos apenas ligar o "queixómetro" e sentirmos que de repente parece que temos alguma coisa a dizer? É como se às vezes as nossas dificuldades nos dessem temas de conversa. Razões para falarmos e estarmos com o outro. Se não tivéssemos problemas do que é que falaríamos então? De coisas verdadeiramente úteis? (isso não, credo!) O problema é que queixarmo-nos dá a sensação de que estamos a fazer alguma coisa por nós. E criamos a ilusão de que estamos a receber alguma coisa da parte do outro. 

Na verdade, criar momentos de partilha, intimidade e verdade, com as pessoas de quem gostamos é importante e pode ser muito útil. Mas isto, se o fizermos com o objectivo de construir pensamento, confrontar realidades e possibilidades, para depois avançar para a acção. Essa acção, só pode ser nossa. Não tenhamos ilusões. Nem eu resolvo os problemas do outro, nem o outro resolve os meus problemas. Só o próprio, com a força do seu querer (o verdadeiro) e com o poder do seu pensamento, escolhas e acção é que pode transformar a sua vida.

Na realidade, parece-me que a grande maioria das pessoas até já percebeu isto, no entanto, muitos ainda se vêem presos a uma crença íntima de que um dia, um qualquer super-herói (ou milagre) o irá salvar de si mesmo e da sua inacção. Isto, para descobrir mais tarde (às vezes mesmo bastante tarde) que ninguém salva ninguém. Nós somos o nosso próprio super-herói. E se é verdade que os super-heróis podem agir em conjunto (tipo “Os Vingadores”), a verdade é que cada um tem que fazer uso de si mesmo, da sua acção e do seu poder.

Mas primeiro, se calhar temos que avaliar bem as nossas posições. Os nossos verdadeiros desejos, os nossos verdadeiros ideais. É preciso sabermos exactamente onde é que cada um de nós está, e onde é que queremos verdadeiramente estar enquanto pessoa, enquanto ser individual, capaz de escolher livremente, e para o seu bem pessoal.

sexta-feira, 16 de outubro de 2015

O Poder Mágico dos Braços

Se os olhos são "o espelho da alma", os braços são os seus fieis executores. Os braços recebem, contêm. Podem apertar, aprisionar, mas também podem libertar, deixando vir e deixando ir, ao ritmo do bebé, da criança, do adulto. Com os (a)braços abrimo-nos ao outro e aceitamos recebê-lo e acolhê-lo em nós. Com os braços dizemos coisas simples como "eu estou aqui", "aceito-te como és" e "quando fores, levarás este sentir dentro de ti".

É por isso que devemos abraçar os nossos filhos. É por isso que nos devemos deixar abraçar. É por isso que os abraços são uma das melhores coisas do mundo. No abraço está a sintonia, a comunhão, o corpo rendido. E é por isso que os braços, têm um especial poder mágico. Não esquecendo, porém, que também com os olhos, o sorriso e a escuta, se pode abraçar a Alma de outro alguém. 

Mas, estes mesmos braços, podem ainda viver em si fantasmas do passado e ansiedades do futuro. Só isso explica as inúmeras vezes que ainda se ouve dizer às mães: "não dês muito colo, olha que o bebé fica mal habituado" (como quem diz "cuidado com esse pequeno devorador de carinho"). Só isso explica que se guardem os abraços, "religiosamente", para momentos específicos (casamentos, funerais, aniversários, etc), como se fosse necessário prevenir uma eventual escassez deste bem precioso. E também existem os braços que empurram, e empurram, e por mais que a criança volte (porque não é o seu tempo), os braços repetem para si mesmos "é importante autonomizar a criança". Como se a autonomia de um Ser nascesse do desejo do outro (mãe/pai) e não de si mesmo (um contra senso).

Não deixe que os seus braços tenham medo, não deixe que os seus abraços sejam ansiosos mas, principalmente, não deixe que os seus braços estejam paralisados (por uma qualquer razão). O maior desafio não está em mudar, está em fazer escolhas. As nossas escolhas. Mas é também aí que está o maior poder. Na escolha do que queremos ser, ter e dar. E nós pais, devemos perguntar a nós mesmos, como é que nos deixamos tocar. O que diz a nossa pele quando é tocada por outra pele? Como, e quem, é que eu abraço? Como, e por quem, me deixo abraçar? 

E com as respostas a estas perguntas, podemos querer continuar, ou aprender, a fazer "magia". 

Um abraço bem apertadinho.

Artigo escrito por Ana Guilhas, Psicóloga 
Para a Up To Kids
Originalmente publicado aqui

segunda-feira, 5 de outubro de 2015

A Verdade Sobre os Refugiados

Eu diria que a grande maioria de nós, pessoas que não estão a viver directamente a realidade dos refugiados, dificilmente poderá ter acesso à ou às “verdades” por detrás deste fenómeno. E embora considere que toda a humanidade esteja implicada, de uma forma ou outra, neste processo, quando falo de quem esteja a viver directamente esta realidade, refiro-me a quem está lá, fisicamente, na linha da frente, como refugiado de guerra, migrante, funcionário ao serviço dos países que recebem, voluntário, jornalista ou simplesmente curioso. Acredito que até para estas pessoas, o que os seus olhos vêem, tem tantas interpretações quanto consciências. E consciência, bem ou mal, cada um vive com a sua e alimenta-a da forma como desejar.

Mas para mim, este é sobretudo um momento de outra verdade. Verdade, que estava escondida neste nosso modo “automatizado” de viver, em que só nos damos a conhecer, a nós e aos “nossos”, em tempos de crises internas, e aos outros, em tempos de crises colectivas.

A verdade sobre os refugiados? A única que me parece incontestável é a de que toda e qualquer pessoa apenas consegue dar o que tem em si mesma. E de repente, algumas pessoas só conseguem focar-se nos seus medos (“E se eles vêm cá para nos fazer mal? E se isto tudo for apenas um grande "complot" contra a Europa? E se nos tirarem o trabalho, casas e nos deixarem na miséria?”), outras apenas têm raiva e ódio para dar (“não são como eu, não são iguais ou parecidos comigo, não são, portanto, dignos do mesmo que eu, nem da minha compaixão”), outras negam a realidade e agem como se nada fosse (movimento alimentado por um desprezo, de resto, muito parecido com o ódio). Do outro lado, temos o grupo de pessoas que se transforma e transforma o mundo com o seu amor, solidariedade e capacidade inesgotável de valorizar a Vida. Pessoas que têm necessariamente em si, coragem, força e esperança para dar. Pessoas quem têm apenas um medo, o medo de um dia deixarmos de ser suficientemente “humanos” …

Se tivéssemos o azar das “profecias” cinematográficas, sobre o fim dos tempos, se realizarem, o que seria de nós? O que veríamos em nós? Temos pois, pessoas que se unem, ajudam e partilham o que têm em nome de uma sobrevivência colectiva. Temos pessoas que se juntam em grupos restritos de sobrevivência (genética, geográfica ou qualquer outro critério que consigam inventar), aniquilando ou desprezando quem consideram não pertencer. Outros, paralisados pelo medo, deixariam morrer crianças diante dos seus olhos e, quem sabe, deixar-se-iam morrer também.

A nossa verdade está na resposta a estas perguntas: De todas estas pessoas, quem é que gostaria de ser? Quem é que gostaria de ter por perto? E quem verdadeiramente é?


Originalmente publicado no Jornal de "Notícias de Cá e de Lá", nas crónicas "Com Sentido...", edição de Setembro 2015.

segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Cuidar de quem cuida dos nossos filhos

"Dizemos frequentemente que as crianças mudaram, mas ainda que isso possa ser, em parte, verdade, na realidade fomos nós, adultos, que passámos a ver a infância com outros olhos. Fomos nós que, revendo-nos em criança e perspectivando o nosso futuro, passámos a desejar mais e melhor.
Desta transformação nasceu uma sede de conhecimento, uma necessidade de tornar consciente o que se fazia por instinto, a ambição de desvendar os “segredos” dos nossos filhos, e de dominar as estratégias para o “perfeito” desenvolvimento da criança" Continuar a ler

Autora: Ana Guilhas
Publicado em Up To Kids

sábado, 22 de agosto de 2015

Juízes, Advogados e Carrascos


O Ser Humano vem ao mundo como um Ser genuíno, verdadeiro na sua essência, nas suas necessidades e desejos. Está programado biologicamente para o sucesso, para a sobrevivência, para a vida. Come, chora, grita e sente uma necessidade "básica" de ser profundamente amado. A sua inteligência biológica sabe que a sua sobrevivência está dependente de ser desejado, aceite e, consequentemente, protegido e cuidado pelos seus progenitores. Sabe também, à partida, que vai ter que fazer algumas concessões, ainda que isso possa ter custos muito elevados. 

Vem também dotado de um potente e extremamente complexo aparelho psíquico, que o distingue dos outros animais e determina a sua existência psicológica (muito para além da sua existência física). É também esse aparelho que assegura, simultâneamente, a função de sobrevivência, e a condenação ou a absolvição, numa vida de julgamento permanente. 

Desde logo, os olhos do bebé confundem-se com os olhos da sua mãe (até acredita, inicialmente, que ele e ela são um só). Mas se os seus olhos são puros, os da mãe dificilmente o serão. Esta mãe, carrega em si mesma o amor (ou a falta dele) que um dia viveu como filha, os fantasmas, os medos, as expectativas e todas as verdades, meias verdades e mentiras que assumiu para si mesma ao longo de vários anos de vida. E é com estes olhos, por vezes já muito sofridos, entristecidos, outras vezes esperançosos e cheios de amor, que as primeiras verdades do bebé se encontram. E é aqui que, o seu aparelho psíquico, começa a construir o seu sistema judicial interior. Começa a recrutar os seus juízes, advogados, imprime em si mesmo as (suas) primeiras "Leis da Vida". 

De onde vêm estas Leis? Como é construído o seu código? Até que ponto representa genuinamente a sua verdade? Até que ponto está em sintonia com a sua "Constituição"? Podemos até acreditar, ou tentar fazer parecer, que este tribunal serve para avaliar os outros - o que fazem, o que são, o que merecem de nós. Mas, na realidade, existe um, e um só, réu permanente, e é o próprio. Quanto mais duro o tribunal, maiores serão as nossas penas. Mais tempo viveremos condenados e aprisionados em nós mesmos. Longe, muito longe (pensamos nós) da pureza, do impulso criador e do desejo de um amor que cuida, protege e nutre, com que chegámos a esta vida.

Originalmente publicado no Jornal de "Notícias de Cá e de Lá", nº 33.

sexta-feira, 14 de agosto de 2015

Escolhas Educativas - Parte 3


O que os pais podem dar de mais precioso a um filho, são sem dúvida AMOR e RESPONSABILIDADE. Com isto, estão reunidas duas grandes condições para que a criança possa ser, na sua infância, e mais tarde, na vida adulta, uma pessoa madura, capaz de amar a si mesma e ao outro (com as respectivas empatias, solidariedade, inteligência emocional) e capaz de fazer escolhas que a permitam assumir a sua vida, para si mesma (enquadrando direitos e deveres no grupo a que pertence, e equilibrando o que cabe a si e o que cabe ao outro).

Vimos anteriormente (Escolhas educativas, parte 1 e parte 2que a repressão, a força e a manipulação dificilmente nos levarão a esse objectivo. Não têm um efeito verdadeiramente educativo, os resultados são de curto prazo, e prejudicam a relação pais-filhos e a auto-estima da criança. Então, como fazer para educar um filho baseando a nossa actuação no respeito e na confiança?


1. Clareza nas intenções, regras e comportamento esperado

É fundamental que os pais tenham a certeza de que a criança sabe qual é o comportamento "mais adequado" a assumir numa determinada situação. É também fundamental que os pais tenham a certeza de que a criança já tem, em si, os recursos para o fazer. Por exemplo, só por volta dos 2 anos de idade é que a criança começa a integrar a noção de regra. Até lá, está apenas a tentar desvendar o misterioso e incómodo "NÃO". Por isso, formular regras elaboradas antes deste período, e esperar que a criança as cumpra, é irrealista. Até esta altura, devemos manter a simplicidade do permitido vs interdito. Depois, e gradualmente, podemos avançar para uma organização mais elaborada das regras, apresentando-as da seguinte forma:

  • O discurso deve ser, sempre que possível, formulado pela positiva (ver porquê aqui)
  • Usar as orientações e as regras numa vertente preventiva. Por exemplo, antes de ir ao supermercado com a criança, diga-lhe o que é que vão lá fazer e o que é que vai ser possível ou não fazer, com frases como: "vamos ao sítio x, para comprar coisas para a casa. Temos pouco tempo e por isso vou precisar da tua ajuda. Preciso que fiques perto de mim. Podes ajudar-me a pôr as coisas no carrinho, ajudar a lembrar-me das coisas que temos que comprar e ajudar-me a escolher os teus iogurtes. Podemos parar um bocadinho para veres as novidades na zona dos brinquedos, mas hoje, não vamos comprar nenhum. Combinado?". Neste exemplo, está a envolver a criança na tarefa, o que a vai ajudar a sentir-se parcialmente responsável pelo sucesso da saída. Para além disso, estará muito mais motivada e com vontade de colaborar. Sabe, à partida, que não vai comprar nenhum brinquedo, o que evita que essa frustração seja vivida no momento. No entanto, poderá ver o que há de giro, e quem sabe poderão comprá-lo, numa outra oportunidade.
  • Devemos avisar com antecedência as mudanças de actividade. Por exemplo, é frequente os pais chegarem à sala e dizerem "desliga a televisão porque vamos jantar". A criança que pode estar a meio do episódio, e que, muitas vezes, ainda não tem noção da hora de jantar, sente-se frustrada e injustiçada porque não compreende a arbitrariedade dos horários. Se por um lado, existem situações em que não é possível avisar com antecedência, por outro, é muito importante que quando isso seja possível, os pais o façam. É uma forma de demonstrar que existem horários, sim, mas que os pais compreendem o facto dos filhos terem o seu próprio tempo e que respeitam aquilo que estão a fazer. Por isso, é importante dizer coisas como "vamos jantar daqui a um quarto de hora. Isso quer dizer que, nessa altura,vais ter que desligar a televisão. Talvez seja melhor não começares a ver o episódio que se segue" ou "mais 10 minutos e vamos para casa. Talvez queiras aproveitar para andares, uma última vez, nas coisas que mais gostas aqui no parque".


2. Confiar no nosso filho
Na grande maioria das vezes, colocamo-nos numa espécie de campo oposto ao do nosso filho, como se tivéssemos que travar uma espécie de luta de poderes. Na realidade, é fundamental confiarmos na criança e expressarmos essa mesma confiança na sua capacidade de colaborar positiva e activamente, na estrutura familiar em geral, e connosco em particular. Dizer coisas como "estou a contar contigo para me ajudares na arrumação" ou "como estamos atrasados preciso da tua ajuda para sermos mais rápidos", permite dar responsabilidade à criança. Simultaneamente, estamos a reforçar a sua auto-estima e confiança.


3. Desenvolver uma comunicação genuína e emocional

É muito importante para a criança que os pais exprimam o que sentem perante os comportamentos dela. Mais do que fazer acusações, diga coisas como "depois de um dia de trabalho, sinto-me ainda mais cansada quando tenho que apanhar todos os teus brinquedos" ou "é muito frustrante para mim quando voltas a fazer uma coisa que eu te pedi para não fazeres". Desta forma, estará a ajuda a criança a perceber o impacto que as suas acções têm nos outros. Para além disso, estamos a ensiná-lhe a fazer o mesmo, e a aprender a perceber e expressar o que sente, relativamente aos comportamentos que os outros têm com ela.


4. Apresentar o que tem que ser feito, sob a forma de escolhas

Resulta muito bem, responsabilizar os nossos filhos pelas suas escolhas. Querer uma coisa, muitas vezes, significa abdicar de outras. E é importante deixar claro que são as escolhas da criança que farão a diferença. Se a criança não quer sair do banho porque está a brincar, mais do que ficar numa eterna insistência, é importante mostrar-lhe que tem que optar - "queres sair do banho e ver uns desenhos animados antes do jantar ou queres ficar a brincar e jantar sem ver os desenhos?"À medida que o seu filho for crescendo, as opções podem ser discutidas directamente com ele.


5. As famosas consequências
Apesar de todas as estratégias de prevenção, "idealmente", o nosso filho vai, ainda assim, assumir comportamentos que devem ser "trabalhados". Uma boa forma de intervir, e ajudar o seu filho a desenvolver a noção de responsabilidade, é através do uso das consequências. Mais do que a punição, esta estratégia educativa permite uma aprendizagem e desenvolvimento efectivos do nosso filho. As consequências podem ser naturais ou lógicas.
As consequências naturais são aquelas que acontecem independentemente da nossa acção. Por exemplo, depois de avisar algumas vezes que, a plasticina, não sendo guardada depois da utilização, seca, então é importante que os pais deixem que a acção natural das coisas aconteça. Se a criança não arrumou, deixamos que a plasticina seque. A aprendizagem dar-se-á de forma natural, quando a criança, querendo brincar, não consegue. Para não perder o seu efeito, é importante que os pais não comprem outra plasticina no imediato (isso seria assumir a consequência pela criança, e gera uma aprendizagem muito perigosa). É fundamental que os nossos filhos possam sentir na pele as consequências das suas escolhas. Podemos acompanhar a situação com alguma empatia, o que ajuda a criança a entender o valor protector das regras - "A tua plasticina secou? Por isso é que te expliquei que quando não a arrumamos depois de usar, ela seca. Não deve ser fácil para ti ver que já não dá para brincares com ela".
As consequências lógicas, são aquelas em que os pais fazem uma ligação lógica a algo que fica em prejuízo, devido ao comportamento da criança. Por exemplo, "pintaste a parede do teu quarto, agora vou ter que ficar a limpá-la e já não vamos poder ir ao parque". Também podemos, quando é possível, e a criança já tem idade para isso, criar consequências reparadoras - "pintaste a parede do quarto, agora, em vez de brincares a outras coisas, terás que ficar a limpá-la".
Na realidade, as consequências lógicas, podem ser vistas como uma forma de castigo saudável e ligado ao comportamento. Dizer à criança "pintaste a parede do quarto, agora vais ficar no teu quarto a pensar!" funciona como uma punição, que gera essencialmente zanga por parte da criança. Muitas vezes, esta não entende porque é que pintar a parede é um problema, nem o que é que isso tem a ver com ficar fechado no quarto. A consequência lógica, permite à criança atribuir-lhe um sentido de justiça que vai ser fundamental para a integração da aprendizagem, mais do que alimentar a zanga com os pais.

6. Outras estratégias

É importante ter em consideração que, em crianças mais pequenas, poderão existir situações em que a intervenção dos pais pode ter que ser mais física. Se a criança faz algo que a magoa ou magoa outra criança, tenta subir a uma janela, ou faz outra coisa perigosa, os pais devem impedi-la, pegando-a ao colo, retirando-a da situação ou agarrando as suas mãos ou pés. É muito importante agir sem agressividade, o objectivo é ajudá-la a controlar-se quando ela ainda não é capaz de o fazer por si mesma. 

Nas crianças mais crescidas, é importante conversar com elas em momentos em que ambos estejam mais calmos. Explorar e procurar soluções conjuntas para as situações difíceis e que se têm vindo a repetir, é importante. Assim cria-se um plano conjunto, com responsabilidade de ambas as partes. Isso ajuda a envolver a criança e a motivá-la mais para a colaboração. Perguntas como "o que é que se passou à bocado? Como é que te sentiste? O que achas que podemos fazer para que não volte a acontecer?" vão ajudar a encontrar um espaço comum de entendimento.

Não esquecer que, acima de tudo, os pais devem focar-se em trabalhar a cooperação dos filhos. E os filhos cooperam, quando se sentem ligados e em sintonia com os seus pais. Relações de poder e força tornam a criança mais dependente e separam emocionalmente, relações de confiança e respeito, autonomizam, aproximando emocionalmente. E este é o "paradoxo" que queremos nas nossas vidas.

Autora: Ana Guilhas
Artigo escrito para o Blog "As Viagens dos V's"

terça-feira, 14 de julho de 2015

Protejo-te porque não confio em ti?

Sobre-protecção ou a protecção necessária? Um artigo para reflectir...

"Recentemente, um pai dizia-se assustado, porque o colégio do filho (neste caso seguidor da pedagogia Waldorf) deixava as crianças subirem às árvores. Contudo, dizia conseguir compreender que era uma forma das crianças aprenderem com a queda. Reflectindo um pouco sobre esta questão, é fácil entender o registo em que nós, pais, ainda vivemos. Seja porque a deixamos subir para cair, seja porque não a deixamos de todo subir, assumimos à partida que a criança não consegue. Aparentemente, o sentimento que está na base da nossa escolha, enquanto educadores, é o de que a criança não é capaz. E assim lidamos com os nossos filhos, como se tivéssemos a certeza do seu fracasso ou incapacidade de viver determinadas situações."

Ler o texto na integra aqui
Publicado em Up To Kids

sexta-feira, 10 de julho de 2015

Escolhas Educativas - parte 2

Evolução das Práticas Educativas

Hoje sabe-se que existem respostas melhores do que os castigos, gritos e humilhações. Sabe-se que os nossos filhos, sem uma autoridade salutar, poderão tornar-se adultos inseguros, com baixa auto-estima e/ou que tentam sistematicamente cumprir as expectativas de outras pessoas (perdendo a sua essência e a sua verdade pelo caminho). No entanto, ainda é muito frequente confundir-se autoridade e autoritarismo, respeito e medo. Dar uma "boa educação" ainda é, para alguns pais, criar filhos obedientes. Para algumas pessoas, o “bom filho” ainda é aquele que corresponde às expectativas dos pais.

Gradualmente, vai ganhando terreno uma visão, das relações em família, assente no respeito mútuo, na confiança, no investimento a longo prazo e na liberdade com regras e limites. São também algumas as sugestões para se chegar a uma forma de parentalidade mais alinhada com uma "nova consciência". Mas, comecemos pelo que já não queremos fazer. 

Gritos, palmadas e afins...

É preciso que os pais se consciencializem de que bons resultados e resultados imediatos, são coisas diferentes. Porque, inevitavelmente, se o que pretendemos são resultados imediatos, então o caminho faz-se pelo autoritarismo. Da mesma forma, se quisermos uma obediência “cega”, e se quisermos que os nossos filhos moldem os seus comportamentos por medo das consequências, o caminho de uma parentalidade autoritária é, sem dúvida, a escolha certa. Há no entanto, que estar consciente das consequências desta escolha.

Palmadas, gritos, punições e chantagem, são de eficácia a curto prazo. Na grande maioria das vezes, as crianças começam a procurar formas de continuar a fazer o mesmo, mas sem serem apanhadas. Outras crianças, só se limitam nas acções enquanto acreditam poder haver um castigo. Assim que já não há esse perigo, ninguém sabe verdadeiramente como vão agir (e podem colocar-se, inclusivamente, em situações de perigo). Na realidade, são crianças que não aprenderam o valor das suas escolhas, não desenvolveram a noção de responsabilidade e não aprenderam mecanismos de auto-regulação e de protecção de si-mesmos. 

A longo prazo, os pais que escolhem esta forma de educação ganham uma insegurança para toda a vida, a de nunca saberem exactamente com o que podem contar da parte dos filhos. Para estes pais, vai ficando cada vez mais difícil ver os seus filhos a crescer, e têm muita dificuldade em lhes dar liberdade. Na realidade, e no seu íntimo, não confiam no resultado das suas práticas educativas. Quanto mais a criança cresce neste registo, maiores as probabilidades de vir a viver uma adolescência "arriscada".

Acresce a isto, que as relações assentes em autoritarismo, afastam, mais do que aproximam. Filhos de pais autoritários, ainda que muitas vezes, mantendo-se num estado de grande dependência emocional dos pais (da qual, alguns, se vão tentar libertar na adolescência) sentem, simultâneamente, distanciamento afectivo. São crianças que partilham muito pouco dos seus receios, emoções e necessidades. Carregam o sentimento de não serem verdadeiramente amados.

Se, por exemplo, a palmada rapidamente interrompe uma birra (trocando-a pelo choro da dor física e/ou emocional), por outro, passa uma mensagem pouco óbvia para nós, mas muito significativa para a criança. Os nossos filhos aprendem que bater no outro é uma forma adequada de agir para solucionar determinadas situações. Aprendem que a agressão de uma pessoa mais forte sobre uma mais fraca é aceitável. E, por fim, aprendem que é normal agredirmos quem amamos (ou dizemos amar). Para além disso, os sentimentos vividos na situação são, da parte da criança, de tristeza, ressentimento, sentimentos mistos e ambivalentes de culpa e raiva, e por vezes, desejo de retaliação. Os pais, eles, são invadidos por outros tantos sentimentos, também eles pesados e penalizantes para si mesmos e para a relação. Há que ter presente, que sempre que batemos num filho, (re)colocamo-nos a nós mesmos, nas situações, do passado, em que nos bateram (ou vimos bater). Com toda a carga emocional que isso implica. 

Ainda assim, devo dizer que, os gritos e as palmadas não são motivo para que os pais se sintam de repente pessoas terríveis e que tenham que carregar uma culpa interminável (que também vai afectar a sua relação com os seus filhos). Devem sim, encarar esses momentos, como situações pontuais e oportunidades de aprendizagem. Há que assumir que aquela reacção, diz muito mais sobre os pais (e o seu estado emocional) no momento, do que propriamente sobre a criança.

A polémica palmada pedagógica...

Parece-me importante percebermos que existe como que uma gradação no que diz respeito à resposta educativa e relacional, que vai desde o não reagir à situação (que é o mesmo que não reagir à criança), passa pelo reagir de forma desadequada (pouco consciente e informada) e vai até ao agir o melhor que se consegue. Esta última, corresponde a uma resposta suficientemente boa para que a situação desbloqueie, seja ultrapassada e possa representar um crescimento para todos os elementos envolvidos.

Mesmo que isto seja difícil de aceitar, pior para o desenvolvimento emocional de uma criança, é a total ausência de reacção por parte dos pais. Crianças a quem não é colocado nenhum tipo de limites, de nenhuma forma, sofrem mais que crianças que recebam, pontualmente, uma palmada. Estes, não deixam de estar, naquele momento, a investir no seu filho, e mal ou bem, tentam fazer o melhor que podem. 

Não reagir a uma criança quando ela faz algo que sabe no seu íntimo não poder (e fá-lo precisamente para sentir que tem a seu lado adultos atentos e que a vão proteger de si mesma), é abandoná-la a um vazio afectivo extremamente desestruturante e perigoso. Parece-me que esta é a razão, pela qual se vêm, ainda, na área da saúde mental e pediatria, alguns defensores da "palmada pedagógica". Essa palmada, é dizer "eu estou aqui, mal ou bem, sou teu pai/mãe, e o que tu fazes afecta-me e envolve-me o suficiente a ponto de eu reagir com tamanha intensidade". Note-se que fazendo-o, não estamos perante uma resposta educativa adequada, apenas perante envolvimento, por oposição a um não envolvimento parental.

Pessoalmente, palmadas e gritos, apenas fazem sentido como reflexo da incapacidade dos pais de reagirem de forma diferente naquele momento, e como oportunidade de tomada de consciência para o desenvolvimento de outras formas de (re)agir. 

Note-se que contar até 100 e esperar para conversar com a criança mais tarde, quando todos se encontram mais calmos, não é considerada uma não reacção (antes pelo contrário).


A pergunta que agora se impõe, é...

Não devemos gritar, não devemos bater, então como é que se faz?! A resposta chega no próximo artigo, terceira e última parte deste tema, na qual desenvolveremos as estratégias de acção para a vivência das regras e das frustrações (aprendizagens fundamentais e estruturantes para a vida em família e para a vida adulta) de forma construtiva, respeitosa e mais harmoniosa.

Autora: Ana Guilhas
Texto escrito originalmente para o blog "As Viagens dos V's".

quinta-feira, 9 de julho de 2015

Esta agressividade, que é nossa...

[Deixo-vos uma reflexão escrita para a rúbrica "Com sentido" do Jornal "Notícias de Cá e de Lá".]

Tortura, violência, humilhação... tem surgido de tudo um pouco ultimamente, em casos isolados, repetidos sadicamente e até à exaustão pela comunicação social. Notícias, que passam muito rapidamente para a versão “telenovelas”, deixam no ar uma sentimento de indignação, raiva e medo. O foco está colocado em duas jovens aqui, um jovem ali, um polícia acolá. A mim, assusta-me mais as milhares de pessoas que acorrem às portas dos tribunais e às redes sociais insultar, ameaçar em tons de violência por vezes até superiores aos actos que condenam! Preocupa-me que se tratem humanos como coisas e que se consiga conviver “pacificamente” com o sofrimento alheio (por vezes na porta da frente) mas que se reaja a acontecimentos a quilómetros de distância, como se nos tivessem acontecido a nós, só porque os vimos na televisão ou nas redes sociais. A forma como determinados criminosos agem, diz muito deles. A forma como nós reagimos a isso, diz muito mais de nós.

O melhor de tudo isto, é termos à nossa frente uma grande oportunidade para olhar, reflectir e tentar perceber o que é que afinal se está a passar connosco colectiva, mas também individualmente. Tanta evolução parece afastar-nos dos tempos “negros” da Humanidade em que pouco mais parecíamos ser, que bichos. No entanto, aqui estamos nós, confrontados mais uma vez com a realidade de que por mais "verniz" que se coloque, quando este estala, o que fica à vista de todos, é tudo menos bonito. 

A história da Humanidade mostra bem do que somos capazes de fazer pelo bem e pelo mal. Evolução? Parece-me a mim que nos agarramos a uma agressividade muito nossa, a impulsos de destruição que continuam cá bem guardados. Veja-se a forma como cuidamos deste planeta, que não é senão a nossa própria “casa”. Não faz mal destruir, agredir, ameaçar de morte, insultar, roubar, desde que se creia ter uma "justificação" ou se acredite ficar impune. Só isto explica que pessoas “comuns” entrem num armazém e se apropriem de bens alheios com a descontracção de quem vai ao supermercado. 

Ao contrário do que queremos acreditar, não parece haver um trabalho real de evolução saudável da Humanidade, que nos permita canalizar a nossa agressividade natural de forma construtiva para a criação, para a iniciativa, para a capacidade de transformar e mudar a realidade à nossa volta para melhor. 

E isso é triste para todos nós.

Publicado originalmente no Jornal "Notícias de Cá e de Lá" nº 32, 30 de Junho de 2015.

sábado, 13 de junho de 2015

Escolhas Educativas - Parte 1

Atrever-me-ia a dizer que os pais de hoje, têm uma dificuldade acrescida. Encontram-se em plena viragem dos modelos educativos. O papel dos pais está em transformação, assim como os critérios para as suas escolhas pedagógicas. Já não é suficiente para a maioria das pessoas fazer de uma determinada forma, só porque os seus pais e avós assim o fizeram. Hoje, felizmente, queremos perceber o que é melhor, que consequências (positivas ou negativas) as nossas escolhas têm para o bem estar presente e futuro dos nossos filhos. Isso é bom. Mas implica toda uma reorganização! Essa é a parte difícil!

Antes de mais, é importante saber-se que não existe nada mais protector para a estrutura psíquica humana que a vivência de um profundo e equilibrado amor. Isto quer dizer, que a forma como a família vai viver os sentimentos que os ligam entre si (e em particular aos filhos), vai ser central no processo educativo. Para um desenvolvimento saudável, a criança deve sentir que os pais a amam incondicionalmente, aconteça o que acontecer. O que na realidade não é o mesmo que deixá-la fazer tudo o que quer. Antes pelo contrário, é precisamente por a amarem e se preocuparem com ela, que fazem questão de a orientar (e ensiná-la a viver) num mundo que ainda só está a começar a conhecer.

Isto leva-nos a um segundo aspecto fundamental na parentalidade. Os pais devem estar conscientes do seu papel e de que, invariavelmente são os lideres legítimos da estrutura familiar. São (e é importante que sejam) as figuras de autoridade, que vão acompanhar e orientar as crianças (filhos) no seu processo de crescimento e conquistas. Fazem-no até que estes tenham aprendido, e desenvolvido o suficiente, as competências que lhes permitem começar eles mesmos a assumir estas funções. É por essa razão que não deixamos um bebé mexer numa faca, mas pedimos a um filho mais crescido que nos ajude a cortar o pão. Este é um exemplo simples, mas é válido para tarefas muito mais complexas e centrais como aprender a cuidar de si mesmo.

Um terceiro aspecto a ter em consideração, é o de que estamos a falar de pessoas. E como não podia deixar de ser, cada uma traz para a “equação” o seu próprio valor(es). A criança nasce com um temperamento muito próprio e, é fundamental que os pais aprendam a conhecê-la e a perceber o que é que resulta melhor para ela no equilíbrio amor/limites. É desta forma que se vai definir o tipo de relação que é estabelecida. Por outro lado, temos uma mãe e um pai, que carregam eles mesmos (à par com a suas personalidades) uma história, uma aprendizagem e referências educativas muito próprias. Também aí, é necessário encontrar um equilíbrio pai/mãe (que têm muitas vezes posições contrárias) e adaptar-se às adversidades de um quotidiano desafiante, que deixa pouco espaço para parar, analisar e construir coisas novas com serenidade.

Considerando estes três aspectos, cada família irá depois fazer as sua escolhas e criar o seu próprio modelo, de forma a cultivar o amor, o crescimento de todos os elementos e desta forma também, desenvolver maiores níveis de bem estar e harmonia familiar.

Autora: Ana Guilhas
Texto originalmente publicado em As Viagens dos V's

sexta-feira, 12 de junho de 2015

O Lado Bom dos Gritos!

"Porque ali, naquele momento, surge a oportunidade de olharmos para nós mesmos. Temos a oportunidade de perceber que algo está a retirar espaço em nós. E com isso, passamos a ter a possibilidade de transformar a situação. É preciso saber que o desejável não é termos pais que se conseguem conter no seu desconforto (até um dia…). O que se pretende, é que os pais não gritem porque estão suficientemente bem para não precisarem de o fazer (pelo menos não de forma sistemática)." Leia o texto na íntegra aqui


Texto originalmente publicado em Up To Lisbon Kids

quinta-feira, 11 de junho de 2015

Amor Fácil?!

Era tão bom se o amor fosse fácil?

Não! Não era! O amor não foi feito para ser fácil. Mas a verdade é que o amor também não foi feito para ser doente...

Pois é, um amor romântico, dos filmes ou dos livros, em que a relação é perfeita e o mundo é que não. Em que tudo correria bem, não fossem as ameaças externas, os desencontros provocados pela vida ou por malvadez alheia, não existe.

O amor só pode ser vivido na relação. E a relação é uma construção. Cada tijolo dessa construção é de fabrico caseiro, e é feito do mesmo “material” de que nós somos feitos. A relação que se constrói é assim, apenas e tão só, o reflexo do que cada um dos envolvidos tem em si para dar e construir. A relação é tão sólida quanto a solidez de quem ama, tão saudável quanto a saúde de quem ama, tão inteira quanto a existência de quem ama.

Então quando é que a relação faz sofrer e destrói? Quando nos dói o íntimo e sofremos escondidos. Quando nos ligamos ao outro na esperança de que nos dê aquilo que acreditamos não ter, ou que nos ajude a ultrapassar os fantasmas do passado, ainda que apenas os acorde e reforce ainda mais. Quando carregamos um vazio e vemos no outro o preenchimento. Mas aí, o outro deixa de ser o outro e o eu deixo de ser eu. E se não existimos, não podemos amar. Apenas depender, sofrer e fingir uma esperança que não existe.

Amores doentios, são feitos de necessidade, medo de perda, posse. Imperam os ciúmes sem sentido, a desvalorização, humilhação, a necessidade de modificar o outro na sua essência. A luta faz-se entre os medos infantis e irracionais de cada um. Pessoas incompletas procuram exorcizar os seus fantasmas na relação. O resultado é medo, dor, sofrimento, violência...

Amores saudáveis, implicam afecto, admiração, consideração e respeito de parte a parte. Mesmo na diferença, mesmo nas divergências. Implica que cada um se ame a si mesmo, e veja no outro o reflexo desse amor-próprio. O vínculo é de lealdade e não de pertença. Implica zangas, discussões e descontentamento, também. Mas aqui, com aprendizagem, tolerância e crescimento conjunto.

O amor patológico faz um caminho que vai da paixão à insatisfação ou ao caos. O amor maduro, parte da paixão e segue pelo caminho do ajuste, criatividade e construção.

O amor não se quer simples, nem linear porque o amor é uma força criadora e transformadora. Isso, implica a diferença que dá movimento e que não cola mas complementa.

Publicado originalmente no jornal "Notícias de Cá e de Lá" nº 31, de 3 de Junho.

segunda-feira, 25 de maio de 2015

8 Razões para não Sermos Pais Sedutores

"Nos dias que correm, fala-se muito de comunicação positiva com a criança e do exercício de uma parentalidade com maior respeito pelos filhos e pelas suas necessidades. A forma como os pais exercem o seu papel está, desde há cerca de 50/60 anos, em profunda transformação. O que, com tudo de bom que possa ter (e tem!), traz consigo algumas armadilhas."

Leia o texto na íntegra aqui.
Texto originalmente publicado na Up To Lisbon Kids

7 razões porque é que é tão difícil mudar!

Para todas as pessoas, e pais em particular, que estão a tentar mudar, deixo-vos aqui este texto publicado originalmente no meu facebook. Pode lê-lo também aqui.
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Porquê que reclamamos muito e mudamos pouco? Já pensou sobre isso? Porque é que às vezes temos este sentimento de desejo de mudança e logo de seguida reprimimo-lo com desculpas, razões e tudo o mais que nos ajude a justificar que continuemos “presos” a situações que não nos fazem bem, ou por vezes até, nos fazem mal. Muitos dos padrões que repetimos nas nossas vidas, são adquiridos nas relações precoces, com os nossos pais, outras vamos desenvolvendo ao longo da nossa vida, construindo fragilidades sobre fragilidades. De repente, percebemos que estamos presos. E acreditamos que já não conseguimos sair.

Porque é difícil mudar?
1.    Temos medo do desconhecido, do que vem a seguir. Mais ainda, medo de não se seguir nada e ficar um vazio. É, fundamentalmente, um problema de imaginação. Porque só conseguimos imaginar a partir do que já vivemos ou já existiu e não conseguimos visualizar algo novo e diferente dos nossos “velhos” padrões.
2.    Aceitar o novo, implica desistir do velho. E a verdade é que o velho, para nós, é também o seguro. Ainda que desagradável ou desconfortável, é seguro. Para algumas pessoas, isso é precioso. O que vem a seguir à decisão de mudança, é uma infinidade de possibilidades. Isso é o melhor do “novo”. É que é uma possibilidade de nos (re)conhecermos e nos (re)construirmos. Assim tenhamos nós a coragem para o fazer.
3.    Achamos que é mais fácil pôr uma coisa antiga a funcionar, do que aprender a “manejar” uma nova. A questão é que se fosse fácil, já estaria a funcionar. Se não dá sinais de melhorar, então talvez tenha chegado a hora de aceitar que é assim que vai continuar a estar - "avariado". Ter medo de não conseguir funcionar com o novo, é como deixar de provar alimentos, que nunca comemos antes, porque não sabemos se os vamos digerir bem.
4.    Por uma espécie de teimosia ou ingenuidade - “Estou há tantos anos a tentar mudar isto (sem sucesso), não vai ser agora que vou desistir”. No entanto, diz um ditado chinês que “insanidade, é repetir várias vezes a mesma coisa e esperar um resultado diferente”.
5.    Achamos que vamos ficar em défice ou perda. Porque não vamos receber daquela situação o que esperávamos receber. Para seguir em frente, é necessário aceitar que já não vamos retirar dali o que idealizámos. E como é difícil aceitar isso! Sentimos que saímos “de cena” com saldo negativo. Isto acontece porque estamos focados no que efectivamente não recebemos. A verdade é que tudo o que de bom e de mau foi vivido, não desaparece. Foi real e gerou sentimentos, emoções e aprendizagens. Estas, vêm connosco, assim como todas as memórias. Neste ponto de vista, estamos,“contas feitas”, sempre a ganhar.
6.    Ficar indefinidamente numa situação, ou num padrão que nos faz mal, é muitas vezes também, ter medo do sucesso. Ou porque achamos que não o merecemos, ou porque achamos que ter sucesso é “demasiada areia para o nosso camião”. Aqui, só uma boa dose de auto-conhecimento e de amor-próprio, podem ajudar.

7.    Porque achamos que somos mais fracos e impotentes, do que o que verdadeiramente somos. E quanto menos nos permitimos colocar-nos à prova, mais cresce este sentimento de incapacidade. Muitas vezes, só quando a própria vida decide lançar-nos um desafio é que descobrimos que afinal até somos capazes de mais. Muito mais!

sexta-feira, 22 de maio de 2015

Birras com Gritos Muito Intensos - como lidar com isso.

Antes de mais, é importante dizer que os gritos são uma manifestação frequente das birras. O grito, é na realidade uma manifestação da própria vida em si, de força, de intensidade, vitalidade e desejo de viver e ser livre. A verdade é que é para nós adultos, já "socializados" e obrigados desde cedo a controlar os nossos impulsos e manifestação emocionais, muito difícil gerir e acolher os gritos dos nossos filhos. Olhamos para os gritos como algo que incomoda, que perturba os outros e a nós mesmos. Algo intenso, que deve ser controlado desde logo. Na verdade, é uma questão cultural também. Noutros contextos culturais, os gritos fazem parte de rituais e festas. E, enquanto que por cá choramos baixinho, noutros países, um funeral sem gritos de dor bem audíveis, não é um funeral digno.

Ainda assim, não quer dizer que não possamos debruçar-nos sobre o assunto e tentar perceber se, efectivamente, é possível ou desejável fazer alguma coisa. Antes de mais, é importante começar pela prevenção (ler algumas estratégias aqui). Isso vai permitir diminuir a frequência das birras e, eventualmente,  reduzir a sua intensidade (esta última não é garantida). Em segundo lugar, é preciso entender a razão pela qual o seu filho escolhe especificamente os gritos intensos como "ponto forte" das suas birras. Podemos pôr algumas hipóteses: 

É uma questão de temperamento da própria criança e está enquadrado nesta etapa das birras de forma natural.
É resultado da forma de comunicação que tem em casa. Se estiver rodeado de uma comunicação muito agressiva e com muitos gritos, a criança exterioriza depois toda essa tensão gritando ela também. 
- É resultado da vivência das emoções na estrutura familiar. Por exemplo, pais que carregam emoções negativas e que as retraem no seu dia-a-dia, podem ver a criança manifestá-las no seu lugar (de forma mais descontrolada porque são demasiado pesadas para ela). Raiva, frustração e/ou depressões latentes nos pais, podem ser alguns exemplos. 
- A criança grita porque resulta. Isto quer dizer que os pais, de alguma forma ou cedem ao pedido (mesmo que seja muito raramente) ou ficam focados na criança (o que é um ganho secundário da birra). Sendo assim, mesmo que o processo ocorra de forma inconsciente na criança, ela tende a usar as estratégias que são, ainda que sem querer, reforçadas pelos pais.
- Os gritos tocam numa sensibilidade natural dos pais. Estes, reagem intensa e emocionalmente, fixando, ainda que sem querer, a criança naquele comportamento. Neste caso, quer dizer que a criança encontrou algo a que os pais ou um dos pais é particularmente sensível. Este processo é inconsciente para ambos. Por um lado, a criança sente que a mãe/pai reagem de forma diferente quando surgem os gritos. E da parte dos pais, a reacção é mais intensa precisamente por ter essa sensibilidade. A causa dessa sensibilidade normalmente pertence ao passado dos pais. O segredo está em perceber porque é que é tão difícil para os pais ouvir os gritos do seu filho. O que é que isso lhes recorda? Em quê que isso mexe com os adultos? Quando eram pequenos gritavam? Como reagiriam os seus próprios pais se gritasse daquela maneira? Tinham liberdade para expressar livre e intensamente a zanga e a frustração? Estes impulsos eram imediatamente reprimidos?

Há que referir que estas são algumas hipóteses, existem outras e servem apenas para que os pais possam acima de tudo perceber o que é que está em jogo naqueles momentos. Quando as causas são externas, então devem ser trabalhadas e mudadas de forma a libertar a criança de algo que não é dela. Aí passará a viver as birras de forma mais livre e dentro daquilo que lhe é natural (sim... as birras não desaparecem magicamente). Se a razão por detrás dos gritos for o temperamento da criança, e a forma como esta exterioriza a frustração, a zanga e/ou tristeza, então aí, a sugestão será ajudá-la a transformar essa forma de reagir, noutra mais "evoluída" e que a família possa aceitar melhor. 

As estratégias:
1. Aceitar a criança tal como ela é e entender que naquele momento, está a lidar com emoções que ainda não consegue gerir e que a deixam desestabilizada e/ou até descontrolada. Ou seja, evite gritar, insultar, ameaçar, castigar. 
2. Acolher a energia que ela está a libertar através dos gritos, choro, etc. Para isso é importante perceber o que é que aquele momento representa para nós também. 
3. Seja o que for que tenha decidido, proibido, negado à criança e que tenha desencadeado a situação, mantenha-se firme e não ceda. Não é isso que a criança precisa de si. Precisa sim de perceber que os pais podem ser firmes mas sem ficarem eles mesmos desestabilizados e agressivos. 
4. Diga-lhe que com gritos e choro não consegue entender o que ela está a dizer e que, por isso, vai esperar que ela se acalme para poderem conversar. Diga isto de forma firme mas calma e depois evite continuar a falar (isso alimenta a continuidade e intensidade do momento).
5. Fique por perto, mesmo que decida levá-lo para o quarto por exemplo, fique com ele. Mas não interaja com a criança até que esteja mais calma. 
6. Depois da criança estar calma, aí sim poderá conversar. Diga-lhe o que sentiu, e dê-lhe espaço para fazer o mesmo. Explique que quando está no momento da "birra" não consegue ajudá-lo e só pode esperar que se acalme. Que a birra não serve para que mude de ideias, mas que entende que seja a forma que tem de mostrar que está zangado. Diga-lhe que no entanto, existem outras maneiras de mostrar que se está zangado que podem ser melhores para todos.
7. No momento em que já é possível conversar com a criança, pode ser necessário dizer-lhe que a birra vai ter consequências. Estas devem ser lógicas e associadas ao acontecimento. Por exemplo, se a birra acontece de manhã porque a criança não quer desligar a televisão para ir para a escola, então pode fazer sentido que na manhã seguinte não haja televisão. Para que continue a haver, é importante que a criança faça a sua parte de a desligar na hora combinada. 

Desta forma, os pais vão ajudar a que a criança, gradualmente, encontre outras formas de se manifestar. Ao mesmo tempo, é importante entender que naquele momento ela ainda tem muita dificuldade em lidar com determinadas emoções e principalmente com a frustração. Mas se os pais não cederem, vai aprender que as consegue gerir cada vez melhor. Para isso, é também importante que os pais valorizarem os momentos em que os filhos conseguem acalmar-se e/ou sempre que estes usarem outras formas de agir.

sexta-feira, 15 de maio de 2015

Os 3 Grandes Erros da Escola

"Sou mãe de uma menina de quase 3 anos, que ainda só frequenta a creche. No entanto, hoje a minha preocupação com o sistema escolar ultrapassa já a dimensão profissional, sendo também uma preocupação de mãe. Porquê tão “cedo”? Primeiro, porque sei que uma estrutura como o sistema escolar, leva tempo a mudar. Segundo, porque a escola dos dias de hoje espelha a forma como as sociedades olham para as suas crianças, para o seu presente e para o seu futuro."
Leia o texto na integra aqui

Texto originalmente publicado na Up To Lisbon Kids

terça-feira, 14 de abril de 2015

De bom e de mau...

Às vezes sentimos ou agimos como se as pessoas se "partissem" em partes opostas. Ora são boas, ora são más. Ora são rígidas e autoritárias e isso lhes confere determinadas qualidades, ora são doces e amorosas e isso lhes confere outra tantas qualidades. Permanece por vezes a sensação de que estas duas dimensões não coexistem. Permanece a sensação de que são mutuamente exclusivas.

Algumas vezes, algumas pessoas, parecem esquecer, que em nós existe bom e mau. Amor e zanga. As duas dimensões completam-se e são o que torna as pessoas reais. Aceitar isto, é o que torna as relações mais verdadeiras. As emoções, também.

É com isto que todos devemos conviver (principalmente as nossas crianças). A verdade de que em todos nós existem, convivem e manifestam-se o bom e o mau. E que com todas as nossas partes, sendo inteiros, podemos amar e ser amados.

terça-feira, 7 de abril de 2015

Os Dois Pilares de uma Manhã Tranquila

Para que uma família possa viver as suas manhãs de forma mais tranquila, é importante que invista em dois eixos fundamentais: a organização e a conexão. O primeiro vai permitir rentabilizar o tempo ao máximo e reduzir a confusão matinal. O segundo, vai promover a colaboração de todos os elementos e alimentar o sentimento de harmonia.

Gerir as manhãs de forma organizada:

-  A manhã prepara-se na véspera. Um dos aspectos que o vai ajudar a ter uma manhã mais tranquila é sem dúvida deixar preparado na véspera, tudo o que for possível (p. e. as roupas que vão vestir, a mesa de pequeno almoço, mochilas, lanches, etc.).

Deitar cedo, para que tenha uma noite de sono verdadeiramente reparadora, vai tornar mais fácil o acordar. Vai também deixar os elementos da família mais bem dispostos e activos pela manhã. Esta regra é válida para os adultos também.

- Seja a/o primeira/o a acordar. Se o horário actual tem sido "apertado", então vá antecipando a hora de acordar até que tenha acertado com o horário ideal para a sua família. Lembre-se que as horas da manhã não podem ser esticadas, mas a hora de ir para a cama, essa sim, é definida por si. É preferível ir para a cama mais cedo e acordar mais cedo, do que desgastar as relações familiares em manhãs carregadas de stress e gritos. O seu bem estar e o do seus filhos agradecem!

- Estabeleça uma ordem de tarefas. Esta organização deve ser adaptada a cada família e pode tornar-se mais flexível com o desenvolver da responsabilidade, autonomia e capacidade de organização das crianças. Um exemplo para uma família com ambos os pais disponíveis pela manhã seria:

  • Os pais acordam antes dos filhos e preparam-se.
  • Acordam as crianças. 
  • Um dos pais ajuda as crianças a vestirem-se e a pentearem-se, enquanto o outro prepara o pequeno almoço. 
  • Comem todos juntos. 
  • Lavam os dentes e preparam os detalhes finais. 
  • 15 minutos para brincar/estar com as crianças. 
  • À hora combinada sair. 

- Dependendo das idades da ou das crianças, pode ser interessante ter uma lista interactiva das tarefas matinais a cumprir. Assim os filhos podem organizar-se autonomamente sem que os pais tenham que repetir 20 vezes o que falta fazer. Aqui, entra em acção a sua criatividade!

-  Contrarie a tendência natural que temos de deixar para o fim o mais difícil ou exigente. Para não cair nessa "armadilha" tenha em mente que essas são precisamente as tarefas que deve assegurar que ficam "despachadas" o quanto antes (p. e. deixar pronto o filho mais novo ou pentear cabelos encaracolados).

- Mantenha o foco no momento presente e no que deve fazer para que este corra pelo melhor. Deixe os problemas do trabalho para quando lá chegar. Evite tudo o que possa fazer fora deste período matinal, como por exemplo chamadas telefónicas. É importante também que ajude os outros elementos da família a fazerem o mesmo. Sobretudo as crianças pois é muito fácil perderem-se nas tarefas ou deixarem-se ficar pelos momentos de brincadeira.

Investir na conexão com os seus filhos e companheiro/a:

- Para que tudo corra pelo melhor, não se esqueça que simpatia e boa disposição podem começar por si e pelas suas palavras. Apresente as opções e pergunte à ou às crianças o que é que lhes apetece comer e assim vai evitar conflitos de "quero, não quero". Ao pequeno almoço, se conseguirem estar todos juntos, pode ser interessante conversarem sobre os planos que cada um tem para o seu dia.

- Reserve um tempo para brincar e estar com o(s) seu(s) filhos(s). Muitos dos conflitos matinais, devem-se à falta de colaboração das crianças, que se sentem frustradas e desconectadas dos pais. Estes minutos podem ser combinados no início da rotina ou no final, consoante as idades das crianças e a organização da família. Com filhos mais crescidos, estes minutos podem corresponder a uma boa e divertida conversa ao pequeno almoço. O que importa é que sintam os pais presentes e disponíveis (as correrias e os gritos fazem sentir o contrário).

- Compreenda que as crianças não têm uma noção de tempo igual à dos adultos e, até certa idade, não conseguem entender a rigidez de um horário. Cabe a si, adulto/a, ajudá-las a entender e desenvolver esta capacidade (respeitando a fase de desenvolvimento em que a criança se encontre). E cabe a si, compreender os conflitos e desfasamentos que isto possa causar, criando condições para que sejam superados. Acompanhe, explique e defina estratégias e limites, mas, sobretudo, deixe claro que entende o que o seu filho é, e ainda não é, capaz de fazer.

Lembre-se que as manhãs são o primeiro momento do seu dia. São o primeiro "sabor". Se quer ter um dia agradável, é importante que comece com uma manhã agradável. Para os seus filhos, chegar à escola tranquilamente, animados e cheios de sentimentos positivos, deixa-os livres para se concentrarem e investirem no dia de escola que têm pela frente. Na situação contrária, necessitarão de processar os sentimentos de frustração, zanga e injustiça de uma manhã apressada e tensa.

Boas manhãs!

quarta-feira, 25 de março de 2015

Comunicação que Reforça a Auto-estima da Criança

Felizmente, muitos pais parecem preocupar-se hoje e cada vez mais, com o desenvolvimento emocional dos seus filhos. Durante muito tempo imperaram os aspectos funcionais da educação da criança, com particular preocupação pelo cumprimento de regras, o respeito aos pais (e adultos em geral), e a adaptação mais ou menos forçada à estrutura social. 

Hoje sabe-se que educar é tão mais do que isso!

Hoje sabe-se que da educação dada na infância, e mais até, da relação estabelecida na infância entre pais e filhos, depende a felicidade presente e futura da criança. Sabe-se que, se por um lado, é importante que a criança tenha a capacidade de respeitar e de se adaptar a um contexto social no qual deverá integrar-se, por outro, essa adaptação deverá ser feita também em função das suas próprias necessidades. Só assim poderá sentir-se em estado de equilíbrio e bem estar, com todas as consequências positivas que isso acarreta em termos pessoais e sociais.

Os pais compreendem, cada vez mais, que esse bem estar e desenvolvimento saudável passa também, para além de muitos outros factores, por crescer com uma boa e forte auto-estima. O que por vezes ainda causa dificuldades é sabermos como chegar lá. Para que os nossos filhos tenham uma boa auto-estima, não basta desejá-lo. São muitas as dimensões que entram “em jogo”, como o sentir-se amado incondicionalmente, sentir segurança, reconhecimento e conhecer as regras da estrutura da qual se faz parte.

Todas estas dimensões são vividas e adquiridas essencialmente através da relação, e sabemos que relação e comunicação estão intimamente ligadas. É por essa razão que hoje se assume cada vez mais, e de forma cada vez mais esclarecida, a importância da comunicação (e em particular das palavras) na construção do universo mental da criança. Dependendo do tipo de comunicação dominante, os pais poderão ajudar a desenvolver a capacidade de fazer escolhas, o sentido crítico, a autonomia e poderão ensinar a criança a ser boa para si mesma. E como “bónus”, há que considerar que uma pessoa que se ame genuína e profundamente tem em si a capacidade de amar os outros.

O que tem a nossa comunicação que transmitir e/ou promover para que os nossos filhos possam então desenvolver uma boa auto-estima? 


Bem, um dos aspectos fundamentais, será que a criança consiga valorizar a (construção da) sua própria opinião, mais do que limitar-se a fazer uma colagem à opinião dos “crescidos”, e mais tarde, dos amigos. Por outro lado, será fundamental que se sinta livre para exprimir e compreender as suas próprias emoções.

Uma das chaves de uma comunicação (interna) segura, é a capacidade e o hábito de colocar a si mesmo a questão “como é que eu me sinto nesta situação?”. E como tal, é desejável que os pais ajudem a criança a desenvolver este mecanismo. Assumindo numa fase inicial esse papel no lugar da criança e adaptando gradualmente o discurso, à fase de desenvolvimento em que a criança se encontra. Para um bebé, fará mais sentido dizer algo como “deves estar mesmo zangado por te terem tirado o brinquedo!”, até chegar uma altura mais tarde em que bastará apenas perguntar “e como é que esta situação te fez sentir?”. Quando este tipo de comunicação é estabelecida e os próprios pais costumam exprimir os seus sentimentos, a criança cresce adquirindo o hábito de integrar as emoções no seu discurso de forma natural.


Aspectos centrais de uma comunicação que reforça a auto-estima

1. Exprime amor incondicional, ou seja, as manifestações de afecto são independentes do comportamento e resultados que a criança obtém no dia a dia (por exemplo os resultados escolares);

2. Valoriza a opinião da criança mais do que a colagem e/ou reprodução da opinião dos adultos.
3. A escuta é activa. Os pais fazem perguntas para perceber melhor o que a criança está a contar. 
4. O adulto ouve sem corrigir e sem minimizar as preocupações da criança.
5. O adulto não se apressa a resolver os problemas ou a dar respostas. Explora sim, alternativas e opções com a criança.
6. Ajuda a criança a exprimir, aceitar e compreender as suas próprias emoções.
7. Não é intrusiva, e reconhece que a criança não tem que contar tudo, tendo liberdade para guardar algumas coisas para si mesma.

No limite, podemos considerar que educar uma criança é, antes de mais, acompanhá-la, mostrando-lhe que é aceite e pode aceitar-se a si mesma tal como é, fazendo as suas próprias escolhas, e acolhendo em cada situação as suas próprias emoções. É ensiná-la a geri-las com compreensão, tolerância e sabedoria. É também mostrar-lhe todos os dias que, ainda que estejamos cá para ela, confiamos na sua capacidade para ir construindo o seu caminho, cada vez mais por si mesma. 

E isto é Amor!

“E tu Mãe? Tens Livro de Instruções?”

É tão habitual ouvir-se dizer que os filhos não trazem livro de instruções. Gostava de propor fazermos a reflexão inversa! “Eles” não trazem livro de instruções? Então e nós, mães e pais? Trazemos?

Uma mãe não nasce no dia em que dá à luz. Talvez até possa, em certa medida, “renascer” ou “reinventar-se”, mas tudo o que ela é, tudo o que viveu até aquele momento, faz invariavelmente parte da sua existência e vai, invariavelmente, acompanhá-la em tudo o que viverá e será no seu papel de mãe. Traz portanto consigo uma “mochila” já bem cheia e na qual, terá que arranjar um cantinho para algo tão “espaçoso” como a maternidade. Uma mãe é mulher, filha, neta, cidadã. Uma mãe tem fantasmas, medos e fragilidades. Uma mãe tem esperanças, desejos e expectativas. Nada disso desaparece no dia em que se faz mãe. Antes pelo contrário, tudo isso se revela e se intensifica!

O primeiro olhar dos nossos filhos passa em grande medida pelos olhos da sua mãe, numa linguagem de emoções, que nem sempre compreende. Ora a mãe está feliz, ora está triste, ora a sua voz é suave, ora está a gritar. Umas vezes chora, outras vezes ri-se. Que estranho o mundo lhe pode parecer! Tantas e tantas vezes, estamos a olhar para os nossos filhos e neles procuramos respostas. Esquecemo-nos, por vezes, que também eles nos olham, e mais ainda tantas vezes nos espelham. Atrever-me-ia a dizer que quanto mais olharmos para nós, mais os conseguiremos compreender. E, talvez por isso, o que deveriamos procurar, seja o nosso próprio livro de instruções.